terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Ainda consigo saltar no abismo?


Uma conversa entre eu e meu eu, dentro do carro, no trânsito intenso do Recife, na volta do trabalho para casa.

- Já morri tantas vezes de amor. Tantas, que até perdi as contas. Tantas vezes me apaixonei perdidamente. Algumas vezes fui correspondida, outras nem tanto. Mas em todas morri de amor. E há algo mais intenso de se viver do que se morrer de amor? Não. Pelo menos para mim, não há. É como estar à beira de um abismo e DESEJAR, com cada célula do corpo, o salto. A adrenalina do salto no desconhecido. O salto no abismo insondável das mais intensas emoções humanas. Amor, paixão, ciúme, apego, medo, alegria, êxtase. Êxtase. Êxtase. Sempre tive paixão pelo abismo da paixão. Pelo seu vento batendo no meu rosto e assanhando meus cabelos com o irresistível sussurrar: Pula! Pula! Pula! Paixão pelo frio que dá na barriga ao colocar os pés na beira do abismo e olhar para baixo, avistando apenas o nada. Nada de garantias. Nada de segurança. Nada de certezas. Apenas a emoção de saltar. Saltar rumo às mais intensas sensações. Às mais intensas vivências. Viver cada milésimo de segundo dessa experiência única e fantástica que é morrer de amor.

- E porque você chega agora à beira desse mesmo abismo tão conhecido, muitas vezes tão desejado por você e não se joga como das outras vezes? Porque, Karina? Da última vez em que você se disse covarde para pular novamente, você não resistiu tanto tempo e acabou pulando. Não houve racionalização ou maturidade que controlassem o impulso para mais um salto. Se aprendestes a voar, melhor! Salta! Vais aproveitar mais tempo o belíssimo vôo entre as paredes do abismo!

- Será? Será que dá para saltar no abismo quando se aprendeu a voar? Saltar no abismo exige ENTREGA. Desprendimento. O crer no universo e deixar acontecer. Voar exige controle. Perícia. Atenção. São antagônicos. São contrários. Não. Não é possível saltar no abismo depois de aprender a voar.

- E como será, então? Não vais mais morrer de amor? Parece-me uma perspectiva muito sem graça para alguém que vive com tanta intensidade como você.

- Também me parece assim. Acho melhor rever tudo.

- Rever o que?

- O plano de vôo.

- Que planooooooo? Que vôo? É um salto, Karina!

- Ah! É! É verdade! E agora?

- Agora, é melhor parar de pensar e pular!